segunda-feira, 19 de outubro de 2009

UM AMOR DE CLOWN




“A Palhaça Barrica é minha caricatura física, de pensamento e de sentimento. Tudo em mim levado ao extremo. A Barrica é a boba da corte, a louca, e muitas vezes fala pela Michelle aquilo que o sistema não permite que a ela fale, ou a reprime. Mas como Barrica é boba, pode falar tudo e as pessoas ainda acham graça”.


Michele Silveira da Silva, 27 anos, bacharel em interpretação e direção teatral pela Universidade Federal de Santa Maria, RS.




Conheça nesta edição um pouco mais sobre a vida e obra dessa atriz que adotou Chapecó para morar. O bate-papo agradável rolou no MSN e rendeu uma bela entrevista que você acompanha a partir de agora.





juliano.zanotelli diz:

Michele,quando nasceu essa vontade de interpretar?

Michelle Silveira da Silva diz:

Quando eu era criança, e morava no interior da cidade de São Sepé, perto de Santa Maria, eu ia de dois em dois meses até a casa da minha avó na cidade e ficava fascinada com as novelas. Decorava tudo e ficava encantada com o som dos sapatos das madames. Eu não tinha TV em casa, e nunca tinha visto teatro, só fui assistir a primeira apresentação quando tinha uns oito anos de idade. Ainda lembro da peça que as mulheres da minha comunidade fizeram, e a partir daquele dia fiquei muito empolgada com esta história de representar e comecei a fazer teatro na escola.


juliano.zanotelli diz:

Pode-se dizer q a tua avó foi uma mola propulsora, alguém q te ajudou a aflorar esse lado 'artista'?

Michelle Silveira da Silva diz:

Eu não diria isto, apesar de hoje em dia ela gostar e ficar admirada como decoro o texto e não repito nada. A minha família já tinha artistas. Meu avô e meus tios eram gaiteiros, poetas e tinham sensibilidade pra arte. Eu me iniciei mesmo quando vi aquele grupo de mulheres atuando e brincando com as pessoas da comunidade. Achei divertido. E veja que a primeira peça foi cômica, popular e com muito improviso. Isso sim me influenciou .


juliano.zanotelli diz:

Então, tua família é do meio artístico?

Michelle Silveira da Silva diz:

Do meio artístico popular de comunidade de interior. Ninguém reconhecido, mas na época e na comunidade agradavam. Acredito que se eles tivessem tido oportunidade com certeza teriam se destacado.


juliano.zanotelli diz:

Como assim meio artístico popular de comunidade de interior, defina isso?

Michelle Silveira da Silva diz:

Nas comunidades de interior, onde as pessoas vivem longe da cidade, cercadas por campos, matos e lavouras, sempre tem uma igrejinha e um salão onde acontecem as festas, os bailes. E toda comunidade tem um artista que não é reconhecido na cidade, mas naquela comunidade sim e sempre chamam ele pra animar a festa. Neste sentido meus tios eram artistas, com ouvido pra música, e com pensamento pra poesia. Artistas populares escondidos no meio do mato. Isso sim me influenciou. Foi como se eu fosse o canal que sintetizou a veia artística que eles vinham desenvolvendo.


juliano.zanotelli diz:

Tu nasceu em Porto Alegre e foi para Santa Maria cursar a faculdade? Como foi sua vinda para Chapecó?

Michelle Silveira da Silva diz:

Na verdade eu nasci em Porto Alegre, com 1 ano e meio de idade fui para Passo dos Leites (interior de São Sepé) e aos 12 anos nos mudamos para a cidade de Santa Maria. Meu pai queria que eu continuasse os estudos, sempre foi um grande incentivador dos meus estudos, ele e minha mãe. Santa Maria por ser cidade universitária me abriria várias possibilidades, como realmente abriu. Fiz o curso, e comecei a trabalhar na Universidade, no mesmo curso em que me formei, lá tive o grande prazer de conhecer e conviver com uma amiga aqui de Chapecó, a Inaja Neckel. Quando saímos da universidade ela veio para Chapecó e começou a trabalhar aqui, mas seu sonho era fazer mestrado. Atualmente ela está cursando o curso em Belo Horizonte, MG e com isso assumi as turmas dela e construí o meu espaço na cidade, que hoje já considero minha cidade também. Desenvolvi uma afinidade com Chapecó, que em dois anos de convivência já é mais minha que Santa Maria.


juliano.zanotelli diz:

Como assim, Chapecó tem mesmo esse magnetismo de conquistar as pessoas?

Michelle Silveira da Silva diz:

Acredito que sim, a mim foi assim pelo menos. Lembro que quando cheguei aqui, na primeira semana eu dei uma informação que dizia assim: a loja tal fica ali perto da Pittol. Um amiga ficou impressionada com a minha recente “intimidade” com a cidade e os pontos de referência. Achei engraçado. Não fui só eu que sentiu isso aqui aqui, outras pessoas que conheço também. Chapecó é uma cidade aberta, limpa, ruas grandes, bonita, acho bom morar aqui, mas não sei por quanto tempo.


juliano.zanotelli diz:

Como assim, não sabe por quanto tempo?

Michelle Silveira da Silva diz:

Os ventos me sopram muito pra vários lados. A minha vida é cheia de surpresas, quando vejo já estou indo pra lá e pra cá, e eu vou. Mas se hoje tiver que escolher, eu escolho aqui.


juliano.zanotelli diz:

Tu é assim, deixa o vento te levar?

Michelle Silveira da Silva diz:

Olha, eu como sou geminiana vivo sempre no dilema. Um dos gêmeos me leva pro ar, pro sonho, o outro me leva pro chão pra realidade. Eu sempre quero controlar a situação, mas não consigo, porque as coisas me levam e eu vou indo.


juliano.zanotelli diz:

E me conta como nasceu a Palhaça Barrica?

Michelle Silveira da Silva diz:

Estava no curso de artes cênicas e fiz a disciplina de clown. Neste período nasceu a Beiçorofix. Comecei a fazer a disciplina de Clown, cheia de mitos e de ideias pré estabelecidas do que seria o clown, a segunda vista ele é bem diferente, apesar da roupagem parecida.


juliano.zanotelli diz:

Qual seria a diferença entre palhaço e clown?

Michelle Silveira da Silva diz:

Costumo dizer, que palhaço é de circo, de tradição circense, que usa roupas grandes, perucas, maquiagem carregada, faz um humor mais verbal, com uso de bordões, e faz as esquetes tradicionais com piadas de duplo sentido, com quedas, tapas e tropeços, isso é mais palhaço. O clown, como eu o conheço, surge de uma necessidade de pesquisa da linguagem. É a linguagem do palhaço lapidada, é mais direcionado à essência cômica da pessoa, ao ridículo dela e que ela usa de técnicas pra fazer graça. O clown é mais perto da mímica que do cômico escrachado.


juliano.zanotelli diz:

[continuando] como nasceu a Barrica?

Michelle Silveira da Silva diz:

Então, fiz a disciplina e descobri a Beiçorofix. Beiço, porque nasci chorando. Meu clown nasceu chorando. Nosso nascimento se dava dentro de um processo de iniciação bem delicado. Iríamos usar a máscara o nariz, e pra usar a máscara é preciso um ritual de iniciação a ela, e pra mim foi dolorido. Eu não sabia lidar com o meu ridículo, isso me doía e quando tive que colocar uma roupa que evidenciava minha grande barriga gorda comecei a chorar. Então Beiço, porque nasci chorando. Como chorava, meu primeiro número foi chorar uma ópera, lembrava então PavaRotti. E o fix, é porque eu tinha duas trancinhas que parecia Obelix e Asterix. Surgiu aí o Beiçorofix.


juliano.zanotelli diz:

Um nome complicado de pronunciar, não?

Michelle Silveira da Silva diz:

Sim, e como não era nada popular ninguém entende e pede repetição. Por isso pedi um sobrenome para o meu clown. E me deram BARRICA, pela questão física mesmo, redonducha né? E assim o meu clown foi aos poucos se transformando. Coloquei uma peruca por imposição da minha Missiê, Rozane Cardoso, minha mestre e mãe de clown. Até confesso que não queria colocar a peruca, mas depois que coloquei não tirei mais. Ela também me colocou um casaco, pra me deixar um pouco mais masculina, porque era muito abobada, menininha tonta sabe? Acabei ficando um clown meio menino, meio menina e isso era engraçado. Agora o Missiê Barrica é mais masculino e a Barrica é feminina usa maiô e saia.


juliano.zanotelli diz:

E você foi ‘embora’ com o Circo Teatro Biriba, como foi isso?

Michelle Silveira da Silva diz:

Foi assim, no início de 2008 o Circo Teatro Biriba chegou na cidade de Chapecó. Fui apresentada a ele pelo Neri de Paula, ator e diretor aqui de Chapecó que já conhecia o Geraldo Santos Passos (Palhaço Biriba). Comecei a assistir os espetáculos e me apaixonar pelo palhaço, até que um dia o Geraldo convidou a mim e a meu companheiro de dupla de clowns, Felipe Dagort para nos apresentarmos no teatro dele, porque ficou sabendo que nós tinhamos um espetáculo, o “Enchendo Lingüiça”. Nos apresentamos e ele gostou muito do nosso trabalho. E ficou impressionado que Chapecó tivesse uma dupla de clowns assim. E disse ainda que queria me ver nos encontros de Palhaças no Brasil, porque se encantou com a Barrica, isso me deixou muito feliz. Comecei a vê-lo também como um mestre.


juliano.zanotelli diz:

Foi nessa época também q a tua mestre clown faleceu?

Michelle Silveira da Silva diz:

Isso, a minha Mestre de clown havia falecido e a Barrica andava meio órfã de referências e acabou achando um pai. Sempre tive o sonho de trabalhar num circo, pensei muito até que resolvi escrever para o Geraldo e disse que se ele precisasse de uma atriz com meu perfil que me chamasse. Ele me chamou, larguei tudo e fui em busca do que era meu sonho. Fiquei com a Companhia durante 7 meses, passei por Xanxerê, Chapecó, Guaíra no Paraná, Naviraí no MS e Maravilha. Tempo exato para se fechar um ciclo.


juliano.zanotelli diz:

Como foi essa experiência?

Michelle Silveira da Silva diz:

A melhor experiência prática de teatro que eu podia ter tido, não só como artista, mas como pessoa. A vida no circo é muito fascinante e difícil. Fascinante pela ideia que se tem de liberdade, estar viajando sempre, conhecendo pessoas, lugares, estar em cena todas as noites isso é maravilhoso. Mas é difícil por que depende muito da recepção do público da receptividade da cidade. O que mais me impressionou foi ver os galãs da companhia batendo estacas para montar o circo, o trabalho é bem pesado, e quem vive no circo não escapa de levantar a lona, montar todo o teatro, as carretas de moradias, instalações de água e luz tudo é feito pelos homens do circo, com a colaboração de alguns outros que são contratados. As mulheres fazem a comida, cuidam das crianças e não podem atravessar o espaço do terreno em que se está montando o circo. a divisão é machista


juliano.zanotelli diz:

Como é estar num circo?

Michelle Silveira da Silva diz:

Trabalha-se muito lá. Como pessoa eu entendi melhor o que é conviver em comunidade, e o circo é isso. Todos moram ao redor do circo, e convivem diariamente. Vi o quanto é bom e difícil a convivência. como artista, foi muito rico conviver com o Geraldo Santos Passos, o Biriba. segundo ele eu fiz uma oficina com ele, porque convivi 7 meses. o aprendizado da prática foi muito bom, cenário, figurino, iluminação, ensaios, textos, tudo.


juliano.zanotelli diz:

O que você mais gostava de fazer lá?

Michelle Silveira da Silva diz:

De tudo o que eu fazia lá uma das coisas que eu mais gostava de fazer era passar a roupa do Biriba antes dele entrar em cena. Passava duas mudas de roupas para ele escolher, adorava fazer isso para mim era um ritual.




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